Crédito Consignado para o Setor Privado: entenda as principais informações
Em relatório para o SinproSP, Fernando Lima, supervisor técnico do Escritório Regional do DIEESE em São Paulo, explica os principais pontos sobre o crédito consignado para o setor privado, da Medida Provisória 1.292, de 12 de março de 2025.
Contexto
O Brasil pratica uma das mais altas taxas de juros bancárias do mundo. Segundo dados do Banco Central, em janeiro de 2025, a taxa de juros para pessoas físicas no cheque especial, no cartão de crédito rotativo e no crédito pessoal não consignado alcançaram, respectivamente, 135% a.a., 446% a.a. e 99,7% a.a..
Entretanto, desde 2003, há uma outra modalidade de crédito que oferece taxas de juros menores na medida que o risco é menor para o banco, uma vez que o desconto é realizado diretamente da folha de pagamento da empresa: o crédito consignado. As taxas de juros do crédito consignado dos Servidores Públicos estava, em janeiro de 2025, 24,2% a.a.; do INSS, 23,2% a.a.; e do consignado do setor privado, 41% a.a.. Percentuais consideravelmente inferiores as taxas de juros mencionadas anteriormente.
Apesar dessas características, o crédito consignado para trabalhadores do setor privado com carteira de trabalho assinada nunca teve um volume expressivo, representando apenas 6% de todo o saldo de crédito consignado do Brasil, enquanto o consignado dos servidores representava mais da metade, com 54% do saldo, e o do INSS com 40%. A avaliação é que o consignado privado nunca decolou por dificuldades operacionais, uma vez que era necessário firmar um convênio entre o empregador e uma instituição financeira para que os empregados pudessem solicitar o crédito, além disso, havia as dificuldades por parte dos bancos em realizar análise de risco em um mercado de trabalho privado muito heterogêneo, em setores com alta rotatividade, em empresas de tamanhos muito diferentes, entre outros fatores.
Para destravar o crédito consignado e torná-lo mais barato ao trabalhador, o Governo Federal lançou, no dia 12 de março de 2025, a Medida Provisória 1.292, que criou o “Crédito do Trabalhador” onde visa corrigir essas dificuldades e, assim, ampliar de forma importante o consignado para trabalhadores do setor privado para que tenham acesso a crédito com juros menores do que pagam hoje em outras linhas.
Programa de Crédito ao Trabalhador
Desde o dia 21 de março de 2025 está disponível o novo crédito consignado aos empregados do setor privado. O governo passa a permitir que os trabalhadores formais, dentre eles, os professores do ensino privado, por exemplo, usem o aplicativo da Carteira de Trabalho Digital para solicitar empréstimos em condições mais favoráveis e de forma mais rápida. Assim, o trabalhador não precisa esperar que sua empresa firme um convênio com uma instituição financeira para realizar o crédito consignado. Basta o empregado acessar o aplicativo da carteira de trabalho digital e solicitar o empréstimo consignado. A partir de então, as instituições financeiras habilitadas junto ao Ministério do Trabalho poderão fazer uma oferta de crédito consignado em até 24 horas ao trabalhador que irá analisar todas as ofertas recebidas e irá escolher aquela instituição financeira que oferecer as melhores condições, como prazo, taxa de juros, etc.
As parcelas do empréstimo serão descontadas na folha do trabalhador mensalmente, por meio do eSocial, observada a margem consignável de 35% do salário. Após a contratação, o trabalhador acompanha mês a mês as atualizações do pagamento. A partir de 25 de abril, o trabalhador também poderá fazer contratações pelos canais eletrônicos dos bancos.
Respeitados os termos da Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD, as instituições financeiras terão acesso aos dados do trabalhador por meio do eSocial (remuneração, margem consignável, tempo no emprego, setor de atividade econômica, etc) e, assim, poderão realizar de forma mais apurada análise de risco, criando condições para oferecer taxas de juros menores.
Além disso, a consignação será aplicável a todos os vínculos empregatícios ativos no momento da contratação de crédito e, em caso de rescisão ou suspensão do contrato de trabalho, a consignação será redirecionada para:
I. outros vínculos de emprego ativos no momento da contratação do crédito, mas inicialmente não alcançados pela consignação; ou
II. vínculos empregatícios que surjam posteriormente à contratação da operação de crédito.
Nesses casos, como já estava previsto anteriormente na Lei 10.820/2003, que dispõe sobre a autorização do desconto das prestações do crédito consignado na folha de pagamento, que, tanto o FGTS (até 10% do saldo), quanto a multa rescisória, poderão ser utilizados como garantia nas operações de crédito consignado em caso de demissão. Mas isso não é obrigatório, pois o trabalhador tem autonomia para decidir se quer ou não dar essas garantias.
Outro benefício dessa modalidade é que fica autorizada a portabilidade das operações de crédito consignado entre instituições, ou seja, o trabalhador poderá mudar de instituição financeira, caso encontre condições mais vantajosas.
O ideal é que os trabalhadores não contraiam novas dívidas. Trabalhadores que possuem operações de crédito ativas em outras linhas de crédito mais caras, como cartão de crédito rotativo ou mesmo crédito pessoal não consignado, por exemplo, poderão refinanciar suas dívidas por meio do novo consignado privado, trocando uma dívida muito mais cara por uma mais barata.
Para ilustrar melhor os benefícios dessa nova medida, imagine um professor que tenha um crédito pessoal não consignado de R$ 10 mil a ser pago em 24 meses, com parcelas mensais de R$ 789. O valor total pago, apenas com juros, ao longo de dois anos será de R$ 8.947. Se esse mesmo professor migrar seu crédito pessoal não consignado para o consignado, sua parcela cairá de R$ 789 para R$ 584, e o valor total pago de juros cairá 55%, ou seja, para R$ 4.019. Essa mudança gerará uma economia total ao trabalhador de R$ 4.927 ao longo dos 24 meses. Porém, não aceite imediatamente as primeiras propostas que forem enviadas, pois não existe garantias de que essas taxas realmente são melhores do que as praticadas no mercado. Por isso, compare as taxas oferecidas pelos bancos e, se for o caso, escolha a que conceder a melhor condição de pagamento.
Quem já tem o consignado ativo pode fazer a migração para a nova linha a partir de 25 de abril de 2025. A portabilidade entre os bancos poderá ser realizada a partir de 6 de junho.
Não foi estabelecido teto de juros, mas espera-se que as informações disponibilizadas aos bancos e as garantias fornecidas criem condições para uma redução importante dos juros.
Em 20 de março de 2025, o Ministério do Trabalho e Emprego publicou a Portaria nº 435, que estabelece critérios e procedimentos operacionais para a consignação do desconto em folha de pagamento. Nessa Portaria, ficou estipulado o prazo máximo de 96 meses para o crédito consignado privado e de 144 meses no caso de empresas estatais.
Empregados domésticos e trabalhadores rurais com carteira assinada, além de assalariados de MEIs, também terão acesso ao crédito consignado privado.
A medida tem potencial de beneficiar 47 milhões de trabalhadores com carteira assinada no Brasil. Até segunda-feira, dia 1º de abril, o Crédito do Trabalhador havia liberado R$ 2,8 bilhões em empréstimos consignados para 452.445 trabalhadores. No total, foram firmados 453.494 contratos, com parcela média de R$ 349,20 e prazo médio de 18 meses. O valor médio do crédito concedido por trabalhador foi de R$ 6.240,57, segundo dados da Dataprev e repassados ao Ministério do Trabalho e Emprego.