Com apologia antivacina, deputados aprovam gestantes no trabalho presencial
No dia 16 de fevereiro, o Brasil registrou a marca de 1.020 mortes por Covid-19. Nesse mesmo dia, a Câmara dos Deputados aprovou o retorno das gestantes ao trabalho presencial, depois de completado o ciclo vacinal, inclusive para as grávidas com comorbidades. O texto ainda precisa ser sancionado.
A redação aprovada, o substitutivo da deputada bolsonarista Paula Belmonte (Cidadania/DF), também faz proselitismo negacionista: defende “a legítima opção individual pela não vacinação” e autoriza o retorno da gestante que não quiser imunizar-se, mediante a assinatura de um termo de responsabilidade.
Mais um desserviço da Câmara dos Deputados que tinha a possibilidade de manter a redação do Senado, que era um pouco mais razoável: excluía as gestantes com comorbidades do retorno ao presencial e suprimia alguns delírios da deputada Belmonte. Ficaram com o pior.
Salário maternidade ou auxílio-doença?
Pela proposta, a empresa pode manter a trabalhadora em trabalho remoto. Se a atividade for imcompatível com o trabalho a distância, a gravidez será considerada como de “risco" e a funcionária pode passar a receber “salário-maternidade” do INSS, durante a gravidez até o término da licença de 120 dias. Trata-se, portanto, de uma transferência do custo do salário da empresa para a Previdência.
Isso pode ser um ponto de problema para o pagamento, pelo INSS, já que o afastamento na gravidez de risco é considerado uma licença médica e o benefício é pago, mediante perícia, como “auxílio-doença”, geralmente menor do que a remuneração. Já o “salário-maternidade” é o benefício pago durante a licença gestante de 120 dias e corresponde ao salário integral.
Movimento antivacina
Em dois momentos, o projeto de lei aproveita para fazer a defesa daqueles que se recusam a vacinar-se na pandemia. Ao liberar o trabalho presencial para a gestante não imunizada, a deputada Belmonte refere-se ao “exercício de legítima opção individual pela não vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2” (inciso II, §3º, art.2º) . Não satisfeita, a parlamentar ainda fez nova apologia com a inclusão de um outro parágrafo:
Art. 3º, § 7º O exercício da opção [de não se vacinar] é uma expressão do direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, e não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação qualquer restrição de direitos em razão dela.”
Esse delírio negacionista foi excluído no Senado, mas acabou mantido pela Câmara dos Deputados.
Projeto de lei
A lei que obrigava as empresas a manterem as gestantes em trabalho remoto foi aprovada em 2020, no auge da pandemia, quando foi constatado grande número de óbitos de gestantes. Na época, a deputada Perpétua Almeida (PCdoB/AC), apresentou um porjeto de lei que rapidamente ganhou caráter suprapartidário e subscrito por deputadas de diferentes partidos. Um mês após ter sido apresentada, a proposição foi aprovada com texto substitutivo da relatora, deputada Mariana Carvalho (PSDB/RO). Em maio de 2021, virou lei.*
É claro que, dado o prolongamento da pandema, era necessário discutir quem deveria pagar pelos salários das trabalhadoras afastadas, cujas atividades eram incompatíveis com o trabalho remoto. Mas é inaceitável que a mudança tenha sido aprovada num momento em que a pandemia volta a crescer, mesmo com a vacina.
Quem é Paula Belmonte
A deputada Paula Belmonte é Integrante da bancada evangélica no Congresso Nacional e defensora de pautas ultraconservadoras. Foi coautora do projeto de lei que tornava obrigatório o ensino presencial qualquer que fosse o estágio da pandemia e também de outras propostas mais bizarras, como o PL 2199/2020, determinando que as pessoas curadas da Covid-19 não se submetessem às regras de isolamento social estabelecidas pelo poder público.
*Para lembrar: antes disso, a Fepesp, os SinproSP e demais sindicatos que integravam a Federação conseguiram na Justiça a permanência das professores gestantes em trabalho exclusivamente remoto.