Golpe faz trabalhador assinar rescisão com empresa sem receber o dinheiro
Texto publicado originalmente em DIAP
“Os trabalhadores estão sendo vítimas de golpe”, adverte o advogado Sergio Batalha. Há 2 casos que O DIA teve acesso mostram prática não usual na dispensa de empregados. Em um deles, o ex-empregado, que é analfabeto, dá quitação da verba trabalhista sem ter recebido. Em outro, a ex-funcionária também assinou os papeis e não recebeu a rescisão. Os 2 casos, por acaso, se referem à mesma empresa.
E como seria esse golpe? “O empregado é dispensado e convocado ao departamento de pessoal para ‘assinar a rescisão’. Quando comparece, é informado de que tem de ‘assinar a rescisão para sacar o FGTS’ e que a empresa irá depositar as verbas rescisórias nos próximos dias”, conta o advogado. O que não ocorre. “A empresa não deposita e, quando o empregado entra com o processo na Justiça do Trabalho, essa alega que pagou as verbas rescisórias ‘em espécie’, ou seja, em dinheiro”, acrescenta Batalha.
E faz um alerta: “O trabalhador não deve assinar o Termo de Rescisão do contrato de trabalho sem ter recebido as verbas nele discriminadas, pois o termo tem a natureza jurídica de um recibo de quitação. Ou seja, se o valor líquido das verbas rescisórias discriminadas for de R$ 5 mil, por exemplo, quando o trabalhador assina o termo dá um recibo de R$ 5 mil ao empregador”.
Não assine sem receber
Uma das justificativas para os trabalhadores assinarem o termo de rescisão do contrato de trabalho quando são demitidos é a liberação das vias para saque do FGTS e do seguro-desemprego. Por conta disso Claudinei e Nilma, os 2 trabalhadores que foram lesados por uma empresa, assinaram os papeis.
Mas o advogado Sergio Batalha adverte: a solução para sacar o FGTS mesmo sem o recebimento das verbas rescisórias seria fazer uma ressalva no próprio termo de rescisão, esclarecendo que não recebeu as verbas nele discriminadas.
“O ideal nestes casos é procurar um advogado trabalhista especializado, mas nunca assinar um termo de rescisão sem depósito prévio das verbas ou pagamento no ato”, acrescenta.
Vale ressaltar que o prazo limite para o pagamento das indenizações previstas em contrato é de até 10 dias — a partir do dia do rompimento contratual entre as partes diretamente interessadas. O mesmo período máximo se aplica ao envio dos documentos que comprovem o fim do vínculo com a empresa aos órgãos competentes. Os documentos são a GRRF (Guia de Recolhimento Rescisório do FGTS) e Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados).
3 pessoas diferentes e o mesmo problema: vítimas de calote
Morador de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, Claudinei Jesuíno, de 50 anos de idade, trabalhou por 5 anos em uma empresa prestadora de serviços que cedia funcionários para grandes empresas. Ou seja, ele era terceirizado. No ano passado, Claudinei foi demitido e ao se dirigir para o departamento pessoal da empresa recebeu orientação para assinar o termo de rescisão para sacar FGTS e seguro-desemprego. O dinheiro da rescisão, segundo a empresa informou ao trabalhador, seria pago outro dia. Mas não foi.
“Ficava indo e vindo e eles enrolando para pagar. Até que entrei na Justiça para tentar receber o dinheiro que a empresa me deve”, diz Claudinei. Mas ao chegar na audiência no final deste mês, a empresa alegou que pagou o trabalhador em espécie e mostrou o documento assinado por ele. Só tem um detalhe: o Claudinei só sabe escrever o próprio nome, não sabe ler. O trabalhador lamenta: “Não recebi 1 centavo da minha rescisão, nem férias, nem horas extras, nada. E agora eles dizem que me pagaram em espécie!”
Com dificuldade Nilma Casadias, 58, moradora de Botafogo, desce a escadaria que dá acesso à sua casa. Nilma também trabalhou na mesma empresa que Claudinei de 2009 a 2018, quando foi demitida. Ela conta a O DIA que em maio do ano passado foi dada a baixa na carteira de trabalho, a rescisão foi assinada e — assim como Claudinei — o pagamento não foi feito.
“Na última vez que fui tentar receber na empresa, a funcionária disse que eu não era a única a ‘encher o saco’ e me mandou ir atrás dos meus direitos. Eu fui”, conta. No caso de Nilda ainda há outro agravante: ela está em auxílio-doença pelo INSS e faz uso de muitos remédios. “Minha saúde acabou, não tenho como trabalhar e não recebi o que era meu direito. Não sei o que vou fazer”, lamenta.
E o golpe de alegar que “pagou o que não desembolsou” não se limita à empresa onde trabalharam Claudinei e Nilda. Uma firma de serviços de segurança, também deu o cano em trabalhadores. Luiz Claudio Santos, 56, de Vila Kennedy, conta que por 11 anos trabalhou como prestador de serviços, mas em agosto passado foi demitido. O “modus operandi” foi similar: assinar o termo de rescisão para sacar FGTS e seguro-desemprego. “Recebi os papeis, mas não vi dinheiro nenhum. A saída foi entrar na Justiça”, diz.