Ameaça de terceirização mostra verdadeira face das piores escolas particulares
Ex-presidente do SIEEESP ressuscita e aconselha escolas a perder o pudor e a aderir de vez às irregularidades da terceirização dos professores
Uma parte das escolas particulares, há muito tempo, enveredou pelo caminho da mercantilização de tudo o que fazem. Olhos postos na contabilidade, lápis atrás das orelhas de seus proprietários, transformaram-se num enclave de irregularidades trabalhistas porque descobriram que a precarização das atividades dos professores é um dos caminhos – e dos mais sedutores - para ampliar suas margens de lucro. Nos últimos anos, só a ação do SINPRO-SP e a resistência da nossa categoria é que têm impedido que a situação saia totalmente do controle. Mesmo assim, há de tudo um pouco no mercado em que atuam esses “estabelecimentos”: salários abaixo do piso, pagamentos atrasados, horas-extras ignoradas, dívidas com o INSS e o FGTS, professores sem registro. Um inquérito sobre a atuação desses “estabelecimentos” daria um prato cheio para qualquer Ministério Público ou CPI.
Agora mesmo, em entrevista publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo no dia 11 de fevereiro, o ex-presidente do SIEEESP, José Aurélio de Camargo, famoso pelo acúmulo de denúncias que provocou quando dirigia o sindicato patronal e um dos responsáveis pelo baixíssimo nível de respeito público que o ensino privado tem em São Paulo, saiu-se com mais uma pérola: terceirizar os professores como forma de economizar despesas e permitir “uma redução de até 50% no valor das mensalidades”. Segundo Aurélio, 49 escolas do estado de São Paulo (18 na capital), teriam assinado um contrato de pré-adesão à proposta de terceirização dos professores, além da formação de uma holding dedicada à administração, à publicidade e à confecção do material didático de todas elas. Não é preciso ter muita intimidade com o tema para perceber que de escola mesmo essas bibocas do ensino só teriam mesmo o nome.
A proposta é toda ela uma fraude só, contra os estudantes e suas famílias e contra os professores. Contra os estudantes e suas famílias porque nada garante que, uma vez descaracterizada a função de estabelecimento de ensino, já que tudo será terceirizado, a idéia de que haja qualquer articulação de um projeto pedagógico não viria a ser um engodo. Aquilo que se conhece como escola seria, nesses casos, a mera alocação de um espaço físico sem qualquer compromisso com a Educação, uma espécie de logradouro de estudantes que, naturalmente, terão ali o que pode ser classificado como o que de pior meras alocações de espaços inevitavelmente produzem.
A principal falcatrua, no entanto, é contra os professores, que ficariam sem receber qualquer direito trabalhista caso optassem por se enquadrar na categoria de “prestadores individuais de serviços”. Foi nesse sentido que se manifestou o presidente do SINPRO-SP, prof. Luiz Antonio Barbagli, na mesma reportagem: “a terceirização é uma armadilha”, disse. “No fim do mês, os professores podem até receber mais, mas não terão 13º. Salário, férias, fundo de garantia, recesso remunerado”. Aí é que está: a proposta de terceirização mostra a verdadeira face das escolas porque acaba revelando aquilo que foi sempre seu objetivo principal: um ensino sem os custos sociais do trabalho do professor, como se fosse possível manter uma educação de qualidade prescindindo-se do respeito às normas que regem o trabalho docente.
Mas a proposta é ainda pior se vista da perspectiva futura das escolas que embarcarem nessa canoa: como a legislação sobre a terceirização é clara, isto é, as atividades fins de uma empresa não podem ser terceirizadas e, se desempenhadas regularmente, configuram vínculo empregatício, o canto de sereia do ressuscitado José Aurélio já permite antever a enxurrada de ações na Justiça do Trabalho sempre que um professor se sentisse prejudicado. Como disse Barbagli: “além de causar prejuízo para o professor, o projeto cria um passivo trabalhista enorme para as escolas”.
O SINPRO-SP, como já vem fazendo contra iniciativas isoladas de terceirização do trabalho dos professores – da mesma forma como vem atuando contra as chamadas cooperativas – põe à disposição dos professores todos os seus recursos para evitar que essa safadeza de alguns donos de “escolas” não se constitua numa tendência que prejudique nossa categoria e a própria Educação. E a melhor forma de fazer isso é a denúncia. Além de ações na Justiça do Trabalho, é claro.