Seminário discute causas do adoecimento docente
O SinproSP esteve presente III Seminário Trabalho e Saúde dos Professores: Realidades do cotidiano docente. O evento, realizado pela Fundacentro de São Paulo, escolheu o dia do professor (15 de outubro) para discutir sobre a dinâmica do processo de saúde-doença e sua relação com a organização do trabalho docente.
O Seminário contou com palestras e debates que abordaram violência na escola, a Base Nacional Comum Curricular, os distúrbios de voz relacionado ao trabalho e dois temas que o Sinpro acredita que carecem de discussão aprofundada: o desprestígio docente e a saúde mental dos professores. Confira.
O desprestígio docente
Em sua palestra, o coordenador do Projeto Trabalho e Saúde dos Professores, Jefferson Peixoto, abordou o desprestígio do professor.
Num apanhado, ele conta que o descaso com a categoria é histórico. Pode-se entender que começa durante a Revolução Pombalina, em que o ensino jesuítico foi substituído por aulas régias avulsas e escassas. Seguido pelo Império, onde a inexistência de sistema nacional de educação fazia com que as etapas de ensino (primário e secundário) não se conversassem, apesar da necessidade obrigatória da conclusão de um para cursar o outro. E depois o mesmo modelo seria herdado pela Primeira República.
Além disso, a instrução formal era vista como um privilégio restrito às elites dirigentes do país. Ora, mas em um contexto como este quem tinha conhecimento não deveria ser admirado? Peixoto explica que o então ‘prestígio do professor’ precisa ser relativizado. Ele explica que passava, em partes, por questões de classe econômica. “A escola excluía o aluno que não tinha calçado, que questionava. Era uma escola autoritária, que selecionava. A dissidência era punida com exclusão”.
De acordo com o Jefferson, a escola que temos atualmente é o resultado de nossa história. Ainda que hoje a valorização dos professores esteja prevista no artigo 67 da LDB, ela não acontece. As razões que contribuem para a manutenção do desprestígio dos professores podem ser encontradas em políticas públicas mal sucedidas, investimentos que se voltam à universalização do ensino e as mudanças socioculturais trazidas pela revolução tecnológica e moldadas pela sociedade do consumo.
Contudo, Jefferson Peixoto aponta para a necessidade do que ele chamou de virada educacional. “Nunca se precisou tanto de professores como agora. O acesso ao conhecimento é dinâmico e superficial”. Para ele, “a virada está em o Estado assumir que a educação é central para construir a identidade e a civilidade”, disse o educador da Fundacentro.
Presente no evento, a diretora do SinproSP, Silvia Barbara, criticou o fato de que os professores muitas vezes não são ouvidos em questões que eles dominam bem e que isso gera sofrimento e mal estar. Ela citou como a pesquisa elaborada pela Unesco e a Andi. O estudo mostra que em reportagens sobre Educação, os professores aparecem como fonte em apenas 7,4% delas. “Muitas reportagens fazem críticas injustas aos professores e ignoram avanços que são feitos nas escolas. Isso ajuda a construir uma imagem socialmente desvalorizada e que causa muito sofrimento aos profissionais”.
Saúde mental e o trabalho docente
A psiquatra e professora aposentada da Faculdade de Medicina da USP, Edith Seligmann-Silva discutiu como o trabalho afeta a saúde mental do professor.
Para Edith, o que se entende por estresse está sempre ligado ao corpo e o termo tem se tornado genérico para explicar outros sentimentos e sensações como injustiça, cansaço e desgaste.
A professora explica que as dimensões cognitivas e afetivas estão indiscutivelmente ligadas e a saúde de cada um delas é influenciada pelo estado da outra. “Tudo o que você faz racionalmente, intelectualmente, se não é reconhecido, gera sofrimento, mal estar e pode levar até o adoecimento”, afirma a médica.
Edith também conta que as relações de força e de poder, bem como as perdas de confiança e as perdas físicas, podem se intensificar e causar o adoecimento. “A partir dessas relações de poder que se desencadeiam os problemas de saúde mental relacionados ao trabalho”, disse.
A psiquiatra ainda defende que a pressão da escola, o controle da educação e a liberdade de pensar e ensinar são agravantes que contribuem para o aparecimento de transtornos mentais nos docentes. “O professor não transmite só conhecimento, mas também valores. Educar plenamente é isso, mas tem sido esvaziado. Pensemos no impacto que isso tem sobre a subjetividade. Os professores estão sobrecarregados com toda da burocracia exigida e o trabalho com as novas tecnologias. Quando a liberdade do professor é roubada, ele não pode dar aula como gostaria”, falou.
A professora diz que quanto mais tempo o professor se mantém trabalhando em condições como esta, mais a doença se agrava.
Edith também denuncia as condições de trabalho e salário estão diretamente ligadas ao adoecimento docente. Ela conta que cada vez mais há professores afetados por transtornos mentais, em especial por depressão. “As condições de trabalho, as formas de gestão e o salário precisam mudar. Há uma frustração em que as pessoas vão perdendo a esperança e não conseguem construir alianças com os colegas”.
A saída possível para quem passa por essas situações, segundo a psiquiatra, é o professor deixar de se sentir culpado e romper com as competições instituídas que quebram a solidariedade. O coletivo precisa ser fortalecido para os professores serem reconhecidos.