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‘Future-se’ pretende transformar universidades públicas em ‘balcão de negócios’

Atualizada em 25/07/2019 16:18

Texto originalmente publicado pela Rede Brasil Atual

Para o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) Fernando Cássio, o programa Future-se, apresentado nesta quarta-feira (17) pelo Ministério da Educação (MEC), baseia-se em premissas falsas e ilude professores com promessa de enriquecimento a partir de experiências empreendedoras. A proposta, que vem sendo chamada jocosamente como “Fature-se”, é baseada em experiências das grandes universidades privadas norte-americanas, e vai transformar as instituições de ensino em “balcões de negócio”.

“Se a gente quer se espelhar em modelos estrangeiros, precisamos olhar as universidades públicas de outros países”, critica o especialista, em entrevista ao programa Bom para Todos, da TVT. Ele diz que a premissa adotada pelo ministro da Educação, Abraham Weintrub, de que o gasto no ensino superior público é elevado, também é equivocada.

“Na verdade, existem dados muito substantivos, coletados aqui e no exterior, que dizem que tanto a educação básica, quanto o ensino superior públicos são subfinanciados no Brasil”, afirma Cássio. O problema, segundo ele, não está no gasto por aluno, mas na falta de investimentos que permitam a expansão da infraestrutura e a ampliação de vagas nas universidades públicas. Para rebater o argumento do ministro, ele cita o caso da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), que teve a energia cortada em cinco de seus campi, em decorrência do arrocho de verbas executado pelo MEC.

Dividido por eixos temáticos – gestão, governança e empreendedorismo; pesquisa e inovação; e internacionalização –, o Future-se prevê que parte do orçamento das instituições passe a ser constituído por um fundo imobiliário, que seria formado da venda de imóveis ociosos que façam parte do patrimônio das universidades. O MEC diz ter recebido do Ministério da Economia uma doação equivalente a R$ 50 bilhões em lotes, imóveis e edifícios da União, o que permitiria às reitorias fazer parceiras público-privadas (PPPs), comodato ou cessão dos prédios e lotes.

O governo também defende que a captação de recursos extras seja feita a partir de doações de empresas ou de ex-alunos para financiar pesquisas ou investimentos de longo prazo. Em outro ponto, prevê a concessão legal para empresas nomearem com suas marcas campi e edifícios, os chamados naming rights, além da criação de ações de cultura que possam se inscrever em editais de fomento, como a Lei Rouanet.

Cássio acredita que essas iniciativas não terão “desfecho positivo”. “É uma forma de se desresponsabilizar pelo financiamento público do ensino superior. É como dizer o seguinte: só vamos financiar ou estimular coisas que tenham a aplicabilidade direta e interesse econômico direto.”

Segundo o professor, o risco é que pesquisas não relacionadas a interesses mercadológicos, como “ciência básica”, “demografia” e “sociologia quantitativa” fiquem sem recursos. “É absolutamente aviltante. Não há outra palavra para usar. De fato, é um projeto de destruição do sistema federal de ensino superior.”

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